Butoh, barro, pó, montanha

Vi quando a mando da memória
Ele lambeu desertos antigos
E na língua irrigou com saliva
E no rosto, lágrima
Grão por grão dos destroços da pedra.
Aprendeu com o avô
Que cultivava montanhas lavrando o sabor do tempo
Abrindo nascentes cristalinas
E escorrendo argila fina
Do topo arredondado até o vale.
Brotava argila branca da face-neve e cabelos, vermelho terracota dos quadris-mata e seios, argila preta do pântano e dos pés-raízes.
Sua avó recolhia microcamadas da pele montanhosa com a colher de bambu e apalpava intimamente a matéria ainda úmida. Despia da sua face superfícies cansadas, moldando máscaras na beira do Fugi na borda do dia, abrindo bocas e cântaros de bico-pássaro no fértil do barro nobre.
E o menino seguia se lo-co-movendo e se transformando fogo em flor até o poente.
Só um observador das sombras conseguiria ver o movimento das montanhas e aprender com elas a dançar.